A FAMÍLIA HEBRAICA
Para os hebreus, a família é de origem divina. E, de fato, o é. Disse o Senhor ao criar os primeiros representantes da raça humana: "Façamos o homem à nossa imagem, conforme
a nossa semelhança; e domine sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre todo o réptil que se move sobre a terra.
E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; macho e fêmea os criou.
E Deus os abençoou e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se
move sobre a terra" (Gn 2.26-28).
A importância da família para o judeu é indiscutível.
É considerada mais importante que o próprio indivíduo. Honoré de Balzac, a propósito, escreveu: "Por isso considero a Família e não o indivíduo o verdadeiro elemento social.
Sob esse ponto de vista, arriscando ser olhado como um espírito retrógrado, tomo lugar ao lado de Bossuet e de Bonald, em vez
de andar com os inovadores modernos."
Henri Daniel-Rops ressalta o valor da unidade familiar em Israel: "Quando o jovem Jacó foi procurar seu tio Labão em Harã, a fim de encontrar trabalho e uma esposa; Labão,
ao reconhecê-lo como membro de sua família, exclamou: 'É meu osso e minha carne'.
Este símbolo, tão típico do estilo bíblico, era muito usado pelo povo do Livro, e correspondia à realidade.
A família era em Israel a base vital da sociedade, a pedra fundamental de todo o edifício.
Nos primeiros tempos ela formava até mesmo uma entidade separada sob o ponto de vista da Lei, uma parte da tribo; na época de Cristo era talvez mais frágil do que nos dias
dos patriarcas, quando o indivíduo não tinha valor algum em comparação, mas era ainda muitíssimo importante.
Os membros da família sentiam-se realmente como sendo da mesma carne e sangue; e ter o mesmo sangue significava ter a mesma alma.
A legislação tomara este princípio como base,desenvolvendo-se a partir dele.
A Lei multiplicara, também, suas ordens, a fim de manter a permanência, a pureza e a autoridade da família. Enquanto os judeus desejassem permanecer fiéis à Lei (e isto era quase universal) eles jamais deixariam de admitir o lugar
predominante da família na sociedade."
Prossegue Henri Daniel-Rops: "A família não era apenas uma entidade social, mas também uma comunidade religiosa, com suas festas particulares, em que o pai era o
celebrante enquanto os demais membros participavam.
Algumas das importantes cerimônias exigidas na Lei tinham um forte caráter familiar a Páscoa, por exemplo, tinha de ser celebrada em família.
O elo religioso familiar era tão vigoroso que nos evangelhos e no livro de Atos vemos que os pais que aceitavam os ensinamentos de Cristo levavam com eles
a família inteira."
1 - Casamento.
Os israelitas, no Antigo Testamento, nem sempre alcançavam o ideal traçado pelo Senhor.
A monogamia, por exemplo, não era encarada com seriedade.
Haja vista que homens piedosos como Abraão, Jacó e Davi, eram polígamos.
O que dizer de Salomão?
O mais sábio dos homens tinha 700 mulheres e 300 concubinas!
A poligamia, entretanto, não era sinônimo de devassidão na época.
Um hebreu não podia, por exemplo, tomar como esposa duas mulheres que fossem irmãs ou mãe e filha.
Se tal ocorresse, os infratores seriam apedrejados.
A lei proibia, também, que um homem dormisse com duas de suas esposas ao mesmo tempo.
Com o exílio babilônico, no entanto, os israelitas foram curados da poligamia, que tantos males e transtornos causara em Israel.
No Novo Testamento, não encontramos nenhum caso de poligamia esposta.
O Senhor Jesus exaltou, novamente, o ideal monogâmico e condenou, com energia, qualquer casamento fora desse padrão.
Em conseqüência da esterilidade de algumas esposas legítimas, a concubinagem era
tolerada no período vetero-testamentário. Os ricos, porém, colecionavam concubinas.
Salomão, como já dissemos, tinha 300.
Moisés condenou o casamento misto: "Quando o Senhor teu Deus te tiver introduzido na terra, a qual vais a possuir, e tiver lançado fora muitas gentes de diante de ti,
os heteus, e os girgaseus, e os amorreus, e os cananeus, e os ferezeus, e os heveus, e os jebuseus, sete gentes mais numerosas e mais poderosas do que tu; e o Senhor teu Deus as
tiver dado diante de ti, para as ferir, totalmente as destruirás; não farás com elas concerto, nem terás piedade delas; nem te aparentarás com elas: não darás tuas filhas a seus filhos, e
não tomaras suas filhas para teus filhos.
Pois fariam desviar teus filhos de mim, para que servissem a outros deuses; e a ira do Senhor se acenderia contra vós, e depressa vos consumiria" (Dt 7.1-4).
Havia ainda entre os hebreus o casamento por levira-to.
Quando um homem casado morria sem deixar descendência, o seu irmão era obrigado a casar-se com a viúva.
E por intermédio dos filhos da nova união, a memória do morto era preservada.
Assim prescreve a Lei: "Quando alguns irmãos morarem juntos, e algum deles morrer, e não tiver filho, então a mulher do defunto não se casará com homem estranho de fora; seu cunhado entrará a ela, e
a tomará por mulher, e fará obrigação de cunhado para com ela.
E será que o primogênito que ela der à luz estará em nome de seu irmão defunto; para que o seu nome se não apague
em Israel" (Dt 25.5,6).
2 - Contrato de casamento
O contrato de casamento em Israel era feito pelo pai do noivo, pelo irmão mais velhoou por um parente mais próximo. Excepcionalmente, podiam atuar também a mãe ou um
amigo da família.
Às vezes, o próprio rapaz encarregava-se da concretização do casamento. No entanto, as negociações sobre o dote e outras formalidades ficavam a cargo de terceiros.
Antes da realização do matrimônio, eram feitas exaustivas consultas sobre os bens de ambos.
Eram tomados cuidados especiais também quanto à segurança da noiva e ao enfraquecimento da tribo.
Finalmente, o noivo pagava um dote ao pai de sua futura esposa, que oscilava entre 30 e 50 siclos de prata. Dessa forma, o pai da moça era recompensado
pela perda da filha. Esse pagamento podia ser, também, em forma de trabalho, como ocorreu com Jacó.
A endogamia, ou seja, o casamento entre irmãos, era proibida pela lei de Moisés.
3 - Noivado
Entre os povos ocidentais, o noivado não tem qualquer consistência. Pode ser dissolvido com a maior facilidade. Jocosamente declara Leon Eliachar:
"O Noivado é o período de desajustamento antes do casamento.
" No entanto, entre os hebreus, o noivado era um compromisso sério.
Somente a morte poderia dissolvê-lo.
- Quando começava o noivado? -
A partir do momento em que o moço entregava à sua escolhida uma moeda com esta inscrição: "Seja consagrada a mim."
A cerimônia, bastante singela, era feita na presença de duas ou mais testemunhas.
Com essa solenidade, ambos eram considerados marido e mulher.
Seu relacionamento sexual, porém, somente seria iniciado apôs as núpcias que, segundo a tradição judaica, variava de um mês a sete anos.
Os rapazes, durante o noivado, estavam desobrigados do serviço militar.
4 - Núpcias
As festas nupciais eram celebradas, via de regra, em sete dias. Não raro, chegavam a durar até duas semanas.
Variavam de acordo com o poder aquisitivo dos noivos.
Segundo o Novo Dicionário da Bíblia, essas celebrações eram assinaladas por música e por brincadeiras como o enigma apresentado por Sansão.
A mesma obra esclarece-nos:
"Alguns interpretam o livro de Cantares à luz de certo costume que havia entre os aldeões sírios, de chamar o noivo e o noiva de rei e rainha durante as festividades depois da
cerimônia de casamento, e de louvá-los com cânticos".
5 - Divórcio
O divórcio foi introduzido na Lei mosaica por causa da dura cerviz dos israelitas.
Aproveitando-se da liberalidade dessa legislação, os hebreus rompiam os laços do matrimônio por quaisquer motivos.
Alguns, por exemplo, repudiavam sua esposa por não achá-la graciosa.
O Senhor, entretanto, não aprovava tal comportamento. Tolerava-o, apenas.
Com uma carta de divórcio, concretizava-se o rompimento dos laços conjugais (I)t 24.3). De posse desse documento, a mulher podia contrair novas núpcias.
Caso, porém, viesse a separar-se do segundo marido, não podia voltar ao primeiro. Por quê'.' Esclarecenos Moisés:
"Então seu primeiro marido, que a despediu não poderá tornar a tomá-la, para que seja sua mulher, depois que foi contaminada, pois é abominação perante o Senhor;
assim não farás pecar a terra que o Senhor teu Deus te dá por herança" (Dt 24.4).
Jesus, entretanto, repudiou completamente o divórcio, exceto em caso de adultério: "Moisés por causa da dureza dos vossos corações vos permitiu repudiar vossas mulheres;
mas no princípio não foi assim. Eu vos digo, porém, que qualquer que repudiar sua mulher,
não sendo por causa de prostituição, e casar com outra, comete adultério; e o que casar coma repudiada também comete adultério" (Mt 19.8 e 9).
6 - Filhos
Uma herança divina. Assim os hebreus consideravam os filhos, principalmente os homens, Salmodiou o rei Salomão:
"Eis que os filhos são herança do Senhor, e o fruto do ventre o seu galardão.
Como flechas na mão do valente, assim são os filhos da mocidade.
Bem-aventurado o homem que enche deles a sua aliava: não serão confundidos, quando falarem com os seus inimigos" (SI 127.3-5).
Em Israel, a esterilidade era considerada um opróbrio. Não poucas mulheres afligiam-se por não terem filhos.
Raquel e Ana, por exemplo, rogaram a Deus, com todas as suas forças, o dom da maternidade.
Para as hebréias, não havia privilégio tão grande como o de gerar filhos.
O direito da primogenitura era respeitadíssimo entre os israelitas. Ao filho mais velho cabia a porção dobrada dos bens paternos.
Com a morte do pai, assumia a responsabilidade da casa e as funções sacerdotais da família.
Depois da promulgação mosaica, no entanto, o sacerdócio passou a ser exercido pelos levitas.
As filhas apenas recebiam a herança paterna se não houvesse nenhum filho herdeiro.
Elas eram sustentadas pelos irmãos que se encarregavam, inclusive, de seu casamento.
As israelitas não podiam casar-se com moços de. outra tribo.
Cabia ao pai, também, ensinar aos filhos as primeiras letras e uma profissão. A ociosidade não era tolerada na sociedade hebraica.